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segunda-feira, 24 de maio de 2010

Professores terão exame para ingressar na carreira

Ingresso na Carreira Docente
Instituído Exame Nacional de Ingresso
na Carreira Docente

Portaria publicada na edição de hoje, 24, do Diário Oficial da União institui o Exame Nacional de Ingresso na Carreira Docente. O exame, que será realizado pelo Inep - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – avaliará conhecimentos, competências e habilidades de profissionais que tenham concluído ou estejam concluindo cursos de formação inicial para a docência e que desejam ingressar na carreira do magistério.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Prova de Profissão Docente!!!

Pessoal não esqueçam que hoje será aplicada a avaliação da 1ª unidade da Disciplina Profissão Docente ministrada pelo Prof. Canindé...
Assunto: todo o conteúdo estudado durante todo o mês de Abril e ínicio do mês de Maio, as anotações feitas no caderno, Profissionalismo e profissionalidade, assunto esse visto nos slides que o mesmo passou no primeiro dia de aula.
Estudem!!!
Rafaelle Fadja.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Acompanhe as discussões sobre a política de educação

Acompanhe as discussões sobre a política educacional brasileira no site do senado federal, comissão de educação: http://www.senado.gov.br/web/comissoes/CE/documentos/PACEducacao.pdf

A gestão educacional na interseção das políticas federal e municipal

Revista da Faculdade de Educação
Print version ISSN 0102-2555
Rev. Fac. Educ. vol.24 n.2 São Paulo July/Dec. 1998
doi: 10.1590/S0102-25551998000200003

A gestão educacional na interseção das políticas federal e municipal*



Dirce Nei Teixeira de Freitas**





Resumo:
O artigo refere-se à pesquisa realizada com vistas a apreender e analisar a gestão educacional que se engendra na interseção das políticas federal e municipal, tendo como eixo a relação entre proposição e implementação dessas políticas. Parte da análise crítica da política federal de "reordenação" da gestão educacional e, no trajeto, evidencia os reflexos dessa política na esfera local, os nexos entre ela e a política municipal, bem como a face municipal da gestão educacional. Põe em evidência um padrão de gestão local marcado pela condensação de movimentos de adesão, resistência e de negação à política federal, cuja lógica difere da que sustenta as proposições federais. Frente aos resultados, questiona-se a efetividade e a congruência da política federal para os propósitos anunciados e aponta-se a impropriedade da simplificação no trato da problemática da gestão.

Palavras-chave: política educacional; administração de sistemas; gestão educacional; reforma educacional; federalismo e educação.





1. INTRODUÇÃO

Focalizando a "reordenação" da gestão educacional como problema central da política de educação brasileira dos anos 90, a pesquisa – a que se refere o presente artigo – voltou-se para a apreensão e análise do padrão de gestão educacional que se engendrou na interseção de políticas de educação federal e municipal. Tomou-se como campo de investigação o município de Dourados1-MS, no momento em que essa problemática teve ingresso neste espaço (1993 a 1996).

Inicialmente, caracteriza-se o projeto nacional de "reordenação" da gestão educacional, e, a seguir, revela-se a face municipal da gestão educacional engendrada na interseção das políticas federal e municipal, indicando como se dá a conexão entre estas esferas, quais os reflexos da política federal na esfera municipal e, ainda, como a gestão educacional é vista e realizada no âmbito da instituição escolar. Na conclusão – coordenando as dimensões federal e municipal e as perspectivas de sistema e de instituição escolar, tendo como eixo a relação entre proposição e implementação da política educacional – fazem-se considerações críticas sobre o projeto nacional, tomando como evidência de limites / possibilidades do mesmo o caráter da gestão produzida na interseção do federal e municipal.

Entendendo a política educacional como fração da política social, considerou-se que ela se engendra como resposta a uma pluralidade de atores que não se constituem categorias sociais compactas, homogêneas e monolíticas (Coimbra, 1987). No entanto, diante dos propósitos e, em especial, dos limites do estudo privilegiou-se o ator estatal, dado o seu papel no desenvolvimento capitalista do País, adotando, de um lado, uma ampla política em benefício do capital e, por outro lado, realizando uma política social seletiva e assistencialista, perpassada pelo corporativismo e clientelismo.

Considerando a historicidade da política social, buscou-se levar em conta o caráter cambiante e dinâmico da sociedade capitalista e de que modo o capitalismo contemporâneo estabelece a relação capital, trabalho e fundo público (Oliveira, 1996).

Procurou-se ter presente, no que se refere à "funcionalidade" da política social, que esta se configura especialmente, mas não exclusivamente, pela lógica da reprodução e acumulação capitalista (Offe, 1984). Também a legitimação dos grupos no poder, a necessidade de assegurar a paz social, a intencionalidade de reforçar ideologias (Faleiros, 1995) e de responder à idealização do "redistributivismo" (Vianna, 1991) dirigem e condicionam essa funcionalidade, sendo que os conflitos na relação capital/trabalho produzem mudanças na função da política social.



2. "REORDENAÇÃO" DA GESTÃO: CENTRALIDADE NA REFORMA EDUCACIONAL / ANOS 90

Modificar a organização e reordenar a gestão da educação foram problemas que compareceram recorrentemente na discussão da política educacional brasileira, em diferentes momentos históricos, pondo em pauta temas como descentralização, municipalização (Xavier, 1990 e Romanelli, 1991), participação (Germano, 1994), comunitarismo (Cunha, 1991), gestão democrática e "modernização" da gestão educacional (Farah, 1994)

Vista como o ponto crítico da educação brasileira, na década de 80, a gestão educacional foi adquirindo centralidade na agenda de política educacional dos governos dos anos 90. Engendrar um "novo" padrão de gestão educacional, reordenado segundo parâmetros da "modernização" do Estado e da sociedade, tornou-se projeto justificado tanto em razão de um presumido potencial que teria para assegurar a eqüidade e qualidade do ensino, quanto pelo seu possível papel instrumental no incremento da cidadania e da ordem democrática .Esse intento ganhou maior visibilidade a partir do Plano Decenal de Educação para Todos (1993) e explicitou-se, como projeto nacional, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº. 9.394/96 (Brasil, 1996a).

A Constituição Federal de 1988 já apontava para modificações necessárias na gestão educacional, com vistas a imprimir-lhe qualidade. Do conjunto dos dispositivos constitucionais sobre educação, é possível inferir que essa qualidade diz respeito ao caráter democrático, cooperativo, planejado e responsável da gestão educacional, orientado pelos princípios arrolados no artigo 206 da mesma. Entre estes, colocam-se a garantia de um padrão de qualidade do ensino e a gestão democrática deste (Brasil, 1989).

Já a pretendida "modernização" da gestão educacional/anos 90 orienta-se para um padrão de gestão cuja qualidade resulte de um caráter "eficiente" forjado mediante racionalização administrativa, privatização, co-responsabilização da sociedade, abertura institucional para os "clientes", concentração do poder decisório (no que tange a questões essenciais) e controle centralizado dos resultados.

Na administração estatal intra sistema educacional nacional, esse modelo privilegia a descentralização de competências e encargos, a municipalização de programas, a autonomia, a profissionalização, a avaliação institucional e do ensino. Para além deste âmbito, o "novo" modelo de gestão educacional inclui a viabilização de formas diversas de mobilização de atores sociais, com vistas ao compartilhamento da tarefa educativa, num movimento que relativiza a atuação direta e a responsabilidade estatal nesta área. Com esses propósitos, desencadeiam-se medidas de reforma e inovação político-institucionais e administrativas. Com vistas à racionalização administrativa, adota o planejamento, a longo prazo, práticas e critérios de gestão do setor privado e amplo uso de tecnologias de informação.

A privatização tem na autonomia da escola, no fomento à participação comunitária e na gestão democrática seus principais meios de concretização, na medida em que possibilitam a captação direta e indireta de recursos financeiros, a mobilização de recursos humanos voluntários, e a disponibilização de recursos materiais e físicos suplementares. Tais estratégias potencializam o compartilhamento da tarefa educacional e de sua provisão e, ainda, ampliam a possibilidade da devolução de tarefas para as famílias.

Basicamente, o modelo de gestão educacional em vista tem como horizonte a redução da atuação do Estado, enquanto provedor do serviço educacional, a viabilização de novas formas de provisão da educação e uma maior eficiência da atuação do Estado nos âmbitos conservados sob sua responsabilidade direta.

Norteiam a busca desse padrão de gestão educacional os princípios de focalização, flexibilização e mobilização. Na verdade, tratam-se de princípios que têm dirigido a ação do Estado na área social, segundo critérios político-econômicos postos pelo ajuste estrutural.

O princípio da focalização sinaliza a prática da seletividade na atuação do Estado e a concentração desta em determinadas áreas e problemas. Na verdade, este princípio é indicativo do caráter restrito e emergencial que tem marcado a política social do Estado brasileiro (Draibe, 1993). No caso da política educacional, essa restrição se manifesta, por exemplo, na redução da educação gratuita e universal ao nível do ensino fundamental, sendo a gratuidade deste nível não necessariamente universal fora da faixa etária regular (7 a 14 anos). Nesse sentido, o Estado não se compromete com a eliminação do analfabetismo existente – que atinge largamente a população acima desta faixa etária (IBGE, 1997) – mas, concentra-se na "prevenção" do analfabetismo futuro. As situações de iniqüidade extremadas, que caracterizam quadros de urgência social, são focalizadas como prioridades nacionais, dentro de uma atuação emergencial de molde assistencialista.

A flexibilização, como princípio, orienta a criação e garantia de uma institucionalidade dotada de mecanismos e instrumentos legais, técnicos e burocráticos que possibilitem o rompimento da rigidez formal das estruturas do sistema de ensino e de sua gestão. Tem-se em vista a otimização do processo de escolarização, atuando sobre problemas como o de atraso no ingresso, de permanência na escola, de fluxo escolar, de repetência escolar, de diversidades dos sistemas, instituições e indivíduos. Significa abrir possibilidades para a adoção de medidas emergenciais e particularistas voltadas para o incremento da eficiência do processo de escolarização. Este princípio dá viabilidade a medidas governamentais que concorrem para a precarização da educação formal, como é o caso da oferta de programas de aceleração da aprendizagem, da redução da idade para exames supletivos, do atendimento a jovens e adultos deixado a cargo de programas de cunho voluntário e caritativo, da formação de profissionais da educação através de programas emergenciais (Brasil, 1997). Acena-se para a informalização da escolarização, na medida em que esse princípio garante medidas de aproveitamento, reconhecimento e validação de experiências e conhecimentos adquiridos na educação não-formal e não-institucional.

Se a positividade desse princípio está no incremento da eficiência do processo de escolarização e na garantia de meios e instrumentos para o atendimento a diversidades, sua negatividade estará aí mesmo se, a pretexto de ambos, vier a acentuar a seletividade escolar e, por decorrência, contribuir para o incremento da seletividade social existente.

O princípio de mobilização dirige a ação gestora do Estado no sentido de fomentar o envolvimento ativo dos indivíduos (professores, alunos, pais e outros), das comunidades (em especial a escolar), das organizações sociais e dos setores produtivos da sociedade na implementação das políticas educacionais. A mobilização corrobora para a já mencionada privatização da educação, na medida em que oportuniza a captação e aproveitamento de potencial material, produtivo e político de atores sociais não-estatais. Este princípio norteia a gestão no sentido da busca de responsabilização das instituições, dos indivíduos e segmentos sociais pelos resultados que se têm em vista com a escolarização. Pretende-se uma atuação gestora calcada na função pedagógica de fomento a valores, atitudes e práticas segundo uma visão liberal de construção da cidadania.

Além disso, trata-se de um princípio que orienta a gestão no tocante ao exercício sistemático do controle da demanda social por escolarização. Esse controle busca criar a consciência tanto da urgência social da educação básica, em determinados grupos de indivíduos e setores sociais, quanto da necessidade e possibilidade da educação permanente, como compromisso dos indivíduos e da sociedade.

A política de "reordenação" da gestão educacional se constitui eixo central de um projeto nacional de reforma da educação, atrelado à reforma administrativa do setor público, sendo esta última componente estratégico da reestruturação do Estado brasileiro. Nesta reestruturação, tem-se em vista redefinir a atuação do Estado na economia, em especial, na área de política social, perseguindo novas relações entre Estado e sociedade segundo parâmetros que, no jogo entre requerimentos internos (nacionais) e externos (não-nacionais), determinam a "funcionalidade" da política social e, conseqüentemente, da política educacional.

São determinantes desse jogo as realidades que – num processo dialético – tornaram-se visíveis nos últimos trinta anos, no cenário nacional e internacional. No tocante ao cenário nacional, destacam-se: a explicitação dos limites do modelo de desenvolvimento do país (Singer, 1996 e 1997; Gadelha, 1997); a crise do padrão de financiamento da sua economia (Goldenstein, 1994); a crise do modelo de Estado desenvolvimentista (Fiori, 1995a e 1995b; Sallum, 1994); a configuração de uma democracia que se defronta com problemas de governabilidade (Nogueira, 1995); a adoção de programas de ajustes estruturais (Fernandes, 1995; Sader, 1995) que implicam prescrições e monitoramento de organismos internacionais também na política educacional (Fiori, 1995c, Soares, 1996; Coraggio, 1996).

No cenário internacional, tornaram-se visíveis: a crise econômica mundial (Glyn, 1995, Therborn, 1995; Arighi, 1995); a hegemonia do ideário neoliberal (Anderson, 1995); a reordenação geo-econômica e geo-política mundial (Hobsbawn, 1995); a aceleração dos processos de globalização econômica e o surgimento de blocos regionais (Fiori, 1995c; Braga, 1996; Batista Júnior, 1997; Singer, 1997); o aprofundamento da incapacidade do fundo público para seguir financiando, simultaneamente, as necessidades do capital e do trabalho ou a crise do Estado de Bem-estar social (Oliveira, 1996); os avanços tecnológicos (Dowbor, 1996) e as transformações na área produtiva (Antunes, 1995).

É no contexto desse jogo e determinada por essas realidades que se dá a formulação da política educacional brasileira e sua implementação. É, ainda, nesse contexto que são produzidos consensos mundiais, regionais e nacionais sobre o papel contemporâneo da educação, sobre as relações Estado/sociedade/educação, sobre diretrizes e recomendações quanto à política e à gestão educacional.

Como decorrência, a política educacional brasileira dos anos 90 revela estreita relação com os conceitos, paradigmas, diretrizes e recomendações estabelecidos em fóruns mundiais e regionais. É assim que os paradigmas do "desenvolvimento humano" (segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento/ONU), do "desenvolvimento econômico latino-americano" (CEPAL e Banco Mundial) e da "governabilidade sustentada" (ONU e Banco Mundial) orientam a atual política educacional brasileira.

A Conferência Mundial de Educação para Todos (Jomtien-Tailândia,1990) e a Conferência de Cúpula de Nova-Delhi (1993) indicaram a necessidade de construção de um novo modelo de gestão educacional capaz de assegurar, para todos, uma educação básica de qualidade, vista como uma das condições essenciais do desenvolvimento humano.

A "modernização" institucional é a tarefa básica nas diretrizes regionais para a América Latina, implicando novas formas de gestão educativa que priorizem: a descentralização e a autonomia institucional, os acordos, os consensos, a redistribuição de tarefas entre instâncias do Estado, as estratégias de regulação à distância, a profissionalização, as medidas de responsabilização pelos resultados (entre elas sistemas de avaliação), a abertura institucional para a sociedade, a participação e a privatização (Ottone, 1993; PROMLEDAC V, 1993; UNESCO/OREALC, 1995). Nestas diretrizes, a centralidade da modernização institucional acaba obscurecendo a centralidade atribuída à educação básica, no âmbito mundial, traduzindo a prioridade maior para a América Latina: a reforma do Estado.

Na VI Conferência da Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEI), realizada no Chile, em 1996, põe-se ênfase na governabilidade como condição básica do desenvolvimento humano e econômico, destacando a governabilidade do próprio sistema educacional.

A convergência dessas diretrizes se traduz no princípio de que os mecanismos de mercado são indispensáveis para a melhoria da gestão educacional. No geral, elas propõem novas relações entre Estado e sociedade, mediante reformas institucionais e administrativas vistas como condições básicas para viabilizar um novo espaço público, no qual a vigência de princípios do mercado tornaria possível a adoção de práticas do setor privado e uma menor atuação direta do Estado na provisão e execução de serviços sociais.

A generalização dessas diretrizes – promovida por organismos internacionais2 – impõe-se com o capitalismo contemporâneo, na medida em que este exige que a área educacional deixe de ser tratada como uma questão exclusivamente nacional. Desse modo, o desenho de políticas educacionais é condicionado por imperativos que extrapolam os limites do Estado-nação e as suas particularidades.

Conseqüentemente, a política educacional brasileira pauta-se por uma racionalidade instrumental e utilitarista da educação. Por um lado, vista como ferramenta da competitividade e condição de desenvolvimento econômico e de inserção do País na "nova" ordem econômica mundial. Por outro, vista como ferramenta da governabilidade, condição de produção da cidadania requerida pela sociabilidade capitalista em configuração inclusive para a consolidação da ordem democrática requerida pela mesma (Cardoso, 1994). Esse entendimento atribui à educação as funções básicas de reprodução da força de trabalho, de integração social, de prevenção de conflitos sociais, de formação para o desemprego e para o consumo regidas pelos requerimentos da sociabilidade capitalista em configuração. Tem-se em vista uma "nova" cidadania para um mundo de inúmeras e profundas transformações (da personalidade e da sociedade), que se defronta com diferentes formas de exclusão, com a crescente polarização social e o questionamento das formas tradicionais de representação política (Garretón, 1997).

A partir dessas diretrizes, delineia-se qual qualidade e eqüidade do ensino a gestão educacional deverá garantir, o que e o quanto se vai descentralizar, o significado e os limites da autonomia de gestão, assim como são criados os caminhos e as possibilidades para a privatização e para o controle centralizado da qualidade do produto, dimensionada especialmente em termos de custo-benefício. A direção, o próprio caráter, as formas de realização e os critérios de qualidade da "reordenação" da gestão educacional são condicionados, em grande parte, pela função maior que se tem em vista para a educação: a de "ferramenta da competitividade e da governabilidade democrática".

A "reordenação" da gestão educacional tem sido reduzida às suas dimensões político-culturais e administrativas. Desconsiderando-se a determinação do econômico na configuração do político e do cultural, ignora-se que a "reconstituição do poder" não se viabiliza apenas nestas duas dimensões, entre outras razões, porque a participação dos indivíduos tem sua natureza e limites forjados pelas condições econômicas destes. A pretendida reconstituição de espaços comunitários, mediante o incremento da participação, parece esgotar-se na simples criação de mecanismos e instrumentos que, embora se proponham a contribuir na reeducação dos indivíduos e grupos, se voltam para o atendimento prioritário de requerimentos e interesses imediatos do capitalismo contemporâneo, que seguem impondo constrangimentos ao Estado.

Na verdade, não se prescinde de medidas político-institucionais e administrativas que possibilitem a participação ativa da sociedade. No entanto, a descentralização e a participação não se concretizam apenas com as mesmas, vez que dependem da produção de relações democráticas. Esta é processo complexo e longo, numa sociedade historicamente marcada pelas mais diversas formas de autoritarismo, que o Estado pode favorecer ou inviabilizar.

Coraggio (1996), discutindo as diretrizes de política educacional do Banco Mundial para o Brasil, aponta uma contradição nelas que se verifica, também, na política brasileira de modernização da gestão educacional: enquanto se considera possível reverter "décadas de cultura política centralizada e clientelista, criando quase do zero administrações locais participativas e eficientes" nega-se, entre outros, a possibilidade de realizar modificações radicais e mais igualitárias no sistema fiscal e da propriedade, pôr limites ao movimento especulativo de capitais, fortalecer certas capacidades estatais e criar serviços públicos adequados às necessidades da população. Entrega-se ao mercado a incumbência de satisfazer necessidades sociais e reintegrar as maiorias sócio-econômicas e politicamente marginalizadas, sem levar em conta a realidade de sua estrutura e realização nos âmbitos nacional, regional e mundial.



3. A GESTÃO EDUCACIONAL NA INTERSEÇÃO DAS POLÍTICAS FEDERAL E MUNICIPAL

A investigação mostrou que a instância administrativa municipal pesquisada tem dado lugar de relevância à modernização da gestão educacional, de modo que o intento de "reordená-la" tem marcado o delineamento das diretrizes e as práticas municipais. Entretanto, não há uma concepção comum, entre esta e a instância federal, no tocante à natureza e à forma dessa "reordenação". Todo o conteúdo/forma da reestruturação do Estado, em especial a intenção de descentralização e de privatização, não foram absorvidos com o significado com que compareceram na política educacional federal, anteriormente analisada. A temática da qualidade da gestão educacional e do ensino não chegou a adquirir o conteúdo e os propósitos da excelência pretendida pela instância federal, mas vinculou-se a critérios de eficiência e eficácia, fazendo um movimento numa direção favorável à política federal, embora não de forma consistente.

A "reordenação" da gestão adquiriu, no município, uma feição engendrada por uma lógica utilitarista e pragmática que, no âmbito do sistema, privilegiou estratégias particularistas, clientelistas e populistas para fazer frente às problemáticas da escassez de recursos públicos, da crescente demanda da população por atendimento escolar, das tensões e conflitos que marcaram as disputas de interesses entre os grupos hegemônicos representados por atores governamentais. No âmbito da instituição escolar, não se logrou eliminar o corporativismo e o particularismo vigentes, fomentar a gestão democrática e assegurar uma conexão com as proposições modernizantes da política educacional federal.

A configuração e o caráter particular da "reordenação" da gestão educacional, na esfera municipal, são resultantes: a) de requerimentos sociais que se impõem com as transformações e as permanências que marcam a sociedade e o Estado local; b) dos ajustes a interesses locais hegemônicos, traduzidos em projetos políticos particularistas de grupos e indivíduos situados ou representados na máquina estatal; c) de práticas gestoras enraizadas na cultura local; d) do desconhecimento do conteúdo, forma e essência da política federal; e) da possibilidade de se empreender uma gestão educacional à margem da política federal; f) da constituição precária da burocracia estatal, quer pela não-disponibilidade de técnicos que dominem tecnologias de gestão, quer em razão da dominância do critério político-partidário na composição dos quadros técnicos.

Desde os últimos anos da década de 80, a expansão da rede física, a expansão da cobertura escolar e a crescente universalização do ensino fundamental foram tomados como os principais indicadores de qualidade da gestão educacional municipal, embora se propugnasse – nos programas de governo, nos planos educacionais, nos projetos dos órgãos administrativos municipais e nos planos escolares – a melhoria da qualidade do ensino. De fato, os dados levantados evidenciam a ampliação da oferta, do acesso, e do atendimento, porém, indicam também que não se lograram avanços significativos quanto à permanência e ao êxito escolar.

Com a política federal de "reordenação" da gestão impôs-se ao município a tarefa de perseguir uma qualidade cujo conteúdo, método e significado são fundamentalmente definidos pela lógica econômica – conforme visto anteriormente – na qual cabe a qualidade de gestão que faz restrição a direitos subjetivos e sociais, mediante formas diversas de privatização. No entanto, a gestão educacional municipal – alheia às proposições privatizantes federais – seguiu se efetivando de modo a prevalecerem as estratégias do Estado provedor direto, sendo o aprimoramento destas estratégias a expectativa da escola, no tocante à melhoria da gestão.

Na verdade, a despeito dessa política – cujo ideário de base e linhas mestras de ação foram amplamente divulgados desde o início dos anos 90 e, em especial, a partir de 1993 – o Estado local seguiu amplificando-se com o crescente assumir de compromissos sociais, até o ano de 1996. Entretanto, tendo a escassez de recursos financeiros e o imperativo da reforma do Estado alcançado o município, a administração acabou incluindo, no início de 1997, estratégias de privatização na política educacional municipal, num movimento que partiu do interior do Executivo e que se defrontou com a resistência da escola, em especial, do segmento docente.

A pressão do centro é outra forma pela qual a "reordenação" da gestão educacional municipal vai se concretizando na direção traçada pela política federal. Essa se dá mediante condicionamento da função supletiva da União à adesão, pelo município, a projetos federais. Esta adesão tem implicado um crescente controle central dos resultados que, em alguns casos, alcança o interior da própria instituição escolar.

Não se verificou, no município, a articulação das ações gestoras dentro de um projeto político e pedagógico, tanto na esfera da instituição escolar quanto na do sistema. Os marcos legais estabelecidos na Lei Orgânica Municipal de 1990, as diretrizes do governo municipal do período 1993-1996 e as metas estabelecidas nos planos educacionais formulados nesse período, no município, não chegaram a dar direção, precisar a intencionalidade e assegurar a unidade do projeto educacional local e de sua gestão.

Embora se tenha anunciado uma pretendida descentralização, democratização e "modernização" da gestão educacional – inclusive o intuito de parceria com a sociedade – não se fizeram avanços nesse sentido. Não se promoveram inovações político-institucionais e administrativas significativas e nem modificações consistentes nas concepções e práticas "tradicionais" de gestão. As formas institucionais colegiadas criadas na década de 80 – cujo modelo reproduzia o autoritarismo e o tecnicismo vigentes na década de 60 e 70 – foram "maquiadas" no âmbito da legislação e não se consolidaram na prática.

Mesmo as reformulações burocráticas e procedimentais realizadas não o foram na direção dos avanços propugnados. Os mecanismos e instrumentos de participação não lograram viabilizar uma efetiva mobilização e incorporação da comunidade e dos atores educacionais na "gestão democrática", de modo que esta foi apenas um simulacro já que, na prática, não foi além do processo eletivo para direção de escola e de iniciativas de busca de consenso, mediante consultas a atores escolares, em questões propícias a polêmicas e conflitos.

Também os recursos disponibilizados para o financiamento educacional não atenderam às necessidades, bem como a administração e o controle destes não foram descentralizados e democratizados, conforme se depreende dos documentos referentes a avaliações realizadas pelas escolas, anualmente.

No interior da instituição escolar municipal, os atores escolares, concentrando-se na resistência às práticas autoritárias e burocráticas que permeiam as relações entre escola e sistema, reduzem o desafio de qualificar a gestão educacional a uma ampliação do domínio corporativo dos espaços de poder. Nessa resistência, reproduzem o autoritarismo, acentuam o corporativismo e o particularismo, esvaziando as possibilidades de democratização da escola pública e de sua gestão. Deixam, ainda, de compreender os problemas educacionais numa perspectiva de totalidade, limitando uma possível atuação política em favor da qualificação da gestão educacional.



4. CONCLUSÕES

A pesquisa evidenciou que se configura, no município, um tipo de gestão educacional caracterizado pela condensação de movimentos de adesão, de resistência e de negação à política federal de educação, que são indicativos dos limites/possibilidades, tanto da efetividade dessa política quanto da contraposição a ela, pela instância local.

Esses movimentos explicitam o espaço que a instância municipal dispõe para a implementação de sua própria política. E, neste espaço, a instituição escolar logra ter papel central, uma vez que se constitui na instância na qual, de fato, se objetiva a natureza da gestão e o conteúdo, a substância e a forma da implementação das políticas educacionais.

A especificidade da gestão educacional que se engendrou na interseção das políticas federal e municipal de educação evidenciou elementos que permitem pôr em questão a exeqüibilidade da atual política brasileira de "reordenação" da gestão dentro dos parâmetros em que foi estabelecida. Permitem questionar a plausibilidade de uma abrangência nacional dessa política, uma vez que se revela, em sua própria concepção, alheia a heterogeneidades existentes.

Diante do quadro visualizado com esta pesquisa e, ainda, considerando que o Brasil é um país extremamente heterogêneo, põe-se em questão uma política educacional desenhada, desencadeada, dirigida e controlada num movimento que parte da instância federal do Estado para a instância local. Primeiro, porque desconsidera – por que moldável ou passível de ser sobrepujada? – a lógica local imperante. Segundo, porque a própria lógica que preside essa política – que se pensa homogeneizadora na base, uma vez que fundada nos ditames e requerimentos da sociedade capitalista contemporânea – no confronto com a lógica local gera realidades diversas daquelas que se anunciam como meta, conforme visto. Questiona-se, assim, a congruência dessa política para os fins e objetivos visados. Questiona-se a sua efetividade, entre outras razões, porque prescreve transformações para uma realidade cujas particularidades não dimensiona devidamente, como se aquelas independessem destas.

Além disso, as evidências permitem concluir que a "reordenação" da gestão educacional, tanto na política federal como na municipal, tem ficado limitada a modificações político-institucionais e administrativas. Modificações desta ordem, no geral, não têm logrado atingir o cerne da problemática da atuação do Estado, nesta área. Ao mesmo tempo elas adquirem caráter particular no confronto com a realidade cultural, política e econômica local.

A redução dos problemas educacionais à esfera da gestão além de implicar que sejam vistos como decorrentes da forma, da dinâmica e das estratégias operacionais, implica que sejam atribuídos inteiramente ao Estado e à esfera da política. Ótica esta que, admitindo a dicotomia entre o político e o econômico, deixa de considerar a relação entre os projetos econômico, político e social da sociedade, configurados nas formulações e ações do Estado. Nesse caso, não se coloca em questão a sociedade, nem o Estado é visto como uma produção desta.

Ao se reduzir o problema da gestão educacional à questão do quanto e de que forma deve ser a atuação do Estado (mais ou menos centralizada), dá-se prioridade a medidas de reestruturação e de reformas que privilegiam os aspectos organizacionais e operacionais do sistema educacional e, além disso, são conduzidas setorialmente. Desse modo, a problemática da educação escolar e de sua gestão não é considerada em suas múltiplas dimensões e na perspectiva de contexto e de suas determinações históricas.

A história da educação mostra que o Estado brasileiro, através de suas políticas, esteve sempre reestruturando, ajustando, reformulando velhas estratégias ou propondo novas estratégias e instituições, com vistas a modificar o padrão de gestão vigente. No entanto, subjacentes às formas novas ou reformadas, permaneceram concepções, princípios, valores, interesses, propósitos, atitudes e práticas que não foram tocados por essas modificações. São, na verdade, movimentos que refletem particularmente as permanências da sociedade capitalista que se reorganiza, que se reforma e que se "moderniza", sem resolver suas contradições mais fundamentais.

Nesse processo, as proposições e defesas de novos modelos de gestão apresentaram-se, em geral, fundadas numa concepção abstrata do Estado e de suas crises. Por essa razão, a tendência tem sido o predomínio das "soluções" técnicas, administrativas, institucionais e organizacionais de caráter burocrático, prescritivo e normativo. Estas, no geral, não se têm colocado em confronto e contraposição com interesses políticos e econômicos hegemônicos, em cada momento histórico e nos diferentes espaços.

Pensando-se a partir de uma concepção genérica de Estado, faz-se a proposição de estratégias alternativas à ineficiência, ineficácia e burocratização estatais sem lograr considerar o que, historicamente, tem se constituído em fonte desses problemas: a própria natureza do Estado, das estruturas de poder, o modo de acumulação capitalista, o padrão de financiamento da economia brasileira, entre outras. Estes fatores determinaram o modo de articulação dos interesses sociais, o jogo de forças que se estabeleceu e os canais de participação e de negociação na sociedade brasileira. A educação e sua gestão são determinadas por tais realidades, o que nega a propriedade da simplificação que tende a imperar no trato das mesmas.

A realidade da gestão educacional, na esfera municipal, permite inferir que a caminhada que ainda está por ser feita nesta instância, envolvendo atores da instituição escolar e do órgão gestor do sistema, é a de construção do caráter público da escola municipal. Esta construção supõe a apropriação dos espaços da educação no âmbito do Estado local, pelos profissionais da educação e população.

Uma primeira estratégia dessa apropriação refere-se à construção da autonomia do setor educacional, no âmbito da administração municipal, de modo a assegurar a gestão participativa e democrática dos recursos públicos da educação. Isto significa trazer para a esfera educacional a tomada de decisão, o planejamento, a gestão e a avaliação da aplicação dos recursos públicos destinados à educação. Dentro dessa perspectiva, importa zelar pela efetiva aplicação do § 5º do Art. 69 da Lei Nº 9394/96, que dispõe sobre o repasse automático dos recursos vinculados à educação ao órgão responsável pelo setor.

Esta parece ser condição pedagógica e política indispensável à produção do caráter público da educação municipal e de sua gestão, uma vez que pode democratizar o aprendizado da aplicação /controle/otimização dos recursos públicos captados e redistribuídos pelo Estado. Este aprendizado é central porque qualidades democráticas, eqüidade, eficiência, eficácia e efetividade social dependem da ação ativa, crítica, criativa e solidária do cidadão-sujeito e não da imposição de modelos de gestão fundados em leis do mercado, em princípios liberais.

Avanços nesse sentido não prescindem do enfrentamento do particularismo e do clientelismo, a partir da comunidade e da instituição escolar até às instâncias estatais. Requer, também, a superação do corporativismo dos profissionais do ensino, que tem sido confundido com a luta política possível e necessária na educação municipal. Para tanto, há que perseguir a efetiva criação/implantação e a apropriação democrática, pelos profissionais do ensino e comunidade, de instrumentos institucionais que favoreçam a democratização da gestão educacional. Isto coloca a urgência de que os atores educacionais tenham clareza quanto ao projeto educacional pelo qual lutam – ou precisam lutar – junto às instâncias do Estado.

São necessidades/possibilidades que supõem a solidariedade na relação entre educadores e munícipes atendidos pela escola municipal. Solidariedade que está, também, por ser construída e que não prescinde de uma institucionalidade propícia ainda inexistente. Supõe, também, que se traduza em prática efetiva o princípio constitucional da cooperação entre as instâncias administrativas da federação, de modo a qualificar a educação pública do município.

Com certeza, não será no âmbito da gestão que se resolverá o jogo histórico das relações sociais e de suas contradições, que determinam a natureza do próprio Estado e da sociedade. Contradições que se constituem raízes dos problemas não apenas das políticas educacionais (e demais políticas sociais), mas da desigual e injusta sociedade brasileira, que tem se limitado a uma democracia formal e minimalista (Borón,1994).

Finalizando, é possível afirmar que a qualidade da educação escolar congruente para o propósito de desenvolvimento humano que implique, sobretudo, qualidade de vida para todos – projeto urgente para a sociedade brasileira – não pode ser reduzida a uma questão de gestão. Muito mais quando esta é pensada e conduzida segundo uma lógica economicista fundada teórico-metodologicamente na economia neoclássica (Coraggio, 1996), operacionalmente encaminhada nos limites do político-institucional e administrativo, subordinada à prioridade de reforma do Estado.

A educação – mesmo a especificamente escolar – é questão social que diz respeito à produção da humanidade do próprio homem, particularmente por meio da construção de sua cidadania, sendo, conseqüentemente, processo relevante na produção de um certo tipo de sociedade. Como tal, integra o conjunto de condições objetivas (materiais, situacionais, circunstanciais) e subjetivas que configuram a qualidade de vida humana, revelando a direção que a realidade social imprime à construção da humanidade dos homens. Compõe a historicidade que engendra o homem, o cidadão, a sociedade e as relações sociais que definem a natureza desta. Sendo assim, a qualidade educacional é relevante para o projeto de sociedade que se tem em vista. Isto porque a sociedade é histórica, portanto passível de transformações.

Se o projeto que se tem em vista é o de reprodução do tipo de sociedade que se tem, então é possível pensar numa qualidade da gestão e da educação que resulte dos arranjos e artifícios político-institucionais e administrativos, já que estes não põem em questão a natureza e finalidade desse próprio projeto. É possível reduzir a educação à lógica economicista, subordinando-a aos imperativos político-econômicos engendrados pelo capitalismo em sua face contemporânea. Isto é, torna-se possível perseguir uma qualidade cuja substância, conteúdo e forma são conformados pela lógica do mercado, na busca de solução para os problemas conjunturais e estruturais da ordem capitalista, neste final de século.

Entretanto, a contraposição a esse projeto põe em questão os procedimentos, as estratégias, os mecanismos em virtude de considerá-los sob a perspectiva de suas razões históricas e de suas finalidades. Isto porque se põe em questão o próprio projeto de reprodução da sociedade vigente. Esta posição aponta para o resgate da educação como uma questão de política social voltada para a qualificação do existir humano. Nesse projeto, o Estado é visto não como o ator exclusivo, mas como ator privilegiado e principal responsável pela mediação da construção dessa qualificação. Isto requer que a sua atuação tenha como princípio único a produção da "qualidade social". Qualidade esta que excede à pretendida eqüidade liberal, porque é, sobretudo, universalmente inclusiva. Esta, no entanto, não parece ser possível dentro da lógica que tem dado suporte à atuação do Estado, nos anos 90.

Por outro lado, qualificar a educação tendo como horizonte a "qualidade social" não prescinde de se considerar tanto a "funcionalidade" historicamente definida para essa educação, como a necessidade de múltiplos atores sociais, incluindo aí os próprios gestores e implementadores de políticas educacionais. E considerar, ainda, a complexidade da educação, de sua gestão e dos contextos nos quais estas se fazem realidades concretas.



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Summary:
The article refers to the research accomplished with views to apprehend and to analyse the educational administration that is engendered in the intersection of the national and municipal politics, establishing as the main point the relationahip between proposition and execution of those politics. It begins with a critical analysis of the national politics of educational administration and, in the itinerary, it evidences the reflexes of that politics in the local sphere its connection between the municipal politics, as well as the individual characteristics of the local educational administration. It puts in evidence a pattern of local administration determined by the condensation of adhesion movements, resistance and of denial to the national politics, which logic differs of the one that sustains the national propositions. Face to the results, the effectiveness and the consitency of the national politics for the annouced purposes is questioned, and the impropriety of the simplification in the treatment of the problem of the administration is aimed.

Keywords: educational politics, administration of systems, educational administration, educational reforms, nationalism and education.



(Aprovado para publicação em 19 de novembro de 1998.)

* Artigo elaborado com base na Dissertação de Mestrado em Educação, de mesmo título, defendida em 1997 na UFMS.

** Professora da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul.

1 Com uma população de 153.165 (IBGE, 1996) é o segundo município mais populoso de Mato Grosso do Sul e pólo econômico, político e cultural numa área que abrange 35 % da população estadual. Na área educacional, a administração municipal respondia, em 1993, por 47% do atendimento do ensino fundamental, enquanto a administração estadual cobria 40% e a privada, 13% desse nível de ensino.

2 Banco Mundial, UNESCO, PNUD e UNICEF.

Resumo Informaivo - Modelo Técnico

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Disciplina: Política e Planejamento na Educação - Professor: Ms. Márcio Jocerlan de Souza

ELABORAÇÃO DE RESUMO INFORMATIVO

Texto: Planejamento e educação no Brasil: a busca de novos caminhos (GARCIA in KUENZER; CALAZANS; GARCIA, 2003).
INSTRUÇÕES PARA ELABORAÇÃO
• O resumo deve conter em torno de 500 palavras, como no exemplo apresentado a seguir (A Reforma do Planeta Marte).
• Digitar.
• Fazer o resumo num só parágrafo e usar espaço simples.
• Não deve ser usado nenhum tipo de capa.
• Limitar-se apenas ao texto lido (não se deve incluir assuntos que não estejam contidos no texto original).
• O resumo é do tipo "informativo" e não "crítico", ou seja, deve-se priorizar a informação e não o valor ou a qualidade da informação.
• OBS: Ao digitar, usar fonte "Times New Roman" e tamanho "12".

O RESUMO DEVE SEGUIR ESTE MODELO:

o Nome do aluno em destaque no alto da folha
o Identificação da universidade, centro, departamento, curso, disciplina.
o Título (original) do texto lido
o Nome do autor do texto
o Identificação da fonte
o Mensagem principal (idéia central) contida no texto

Resumo
E X E M P L O


ALUNO: PÔNCIO PILATOS DOS SANTOS
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
Faculdade de Educação
Departamento de Pedagogia
Curso de Pedagogia
Ensino de Ciências II
Título do texto: A reforma do planeta Marte
Autor: Frederick Turner
Fonte: Revista Superinteressante n° 7, julho de 1991, p. 18-24
Mensagem principal: Transformar Marte num planeta capaz de vir a ser habitado futuramente pelos seres humanos.

RESUMO
Um dos projetos mais ousados e ao mesmo tempo mais cativantes propõe nada menos que reconstruir o planeta Marte, isto é, moldar seus recursos naturais, a ponto de torná-lo menos hostil à sobrevivência do homem. Na Terra, ocorreram muitas transformações até que a vida que conhecemos surgisse. O hidrogênio gasoso combinou-se com o oxigênio para formar água: foi dessa maneira que surgiu a maior parte da água dos oceanos terrestres. Se tantas transformações ocorreram na Terra por meios biológicos, não poderia também acontecer em Marte? Os céticos poderiam insistir, dizendo que nenhum organismo terrestre contemporâneo sobreviveria muito tempo em Marte. Mas a questão da água poderia ser resolvida a partir das pequenas reservas de vapor existentes na atmosfera e conhecidas desde o pouso da nave americana Viking I, em meados da década de 70. Análises detalhadas da atmosfera indicam que a pressão atmosférica em Marte já foi alta o bastante para liquefazer a água. Um fato essencial é a cor da superfície marciana: se o solo ficar mais escuro, refletirá menos luz e elevará a temperatura do planeta. O calor, em seguida, libertaria gases atualmente congelados e contribuiria para aumentar a pressão do ar, facilitando o livre curso da água sobre o solo. O impacto dos meteoros artificiais também aqueceria rochas mais profundas e isso talvez faça ressuscitar o extinto Vulcão Olympus Mons. Mesmo se apenas uma fração dos gases liberados por tal impacto permanecesse na atmosfera marciana, seria o suficiente para aumentar consideravelmente sua pressão e temperatura e enchê-la de vida. Muitas das mudanças necessárias em Marte poderiam surgir pelo emprego da nanotecnologia, por meio da qual podem-se forjar estruturas microscópicas na superfície dos metais. Os nanotecnólogos seriam incumbidos de projetar microfábricas químicas para extrair minerais e gases úteis do solo de Marte. Vamos supor, no entanto, que se possa criar um ambiente controlado, análogo ao de Marte, de tal modo que as formas marcianas de vida pudessem engendrar-se a si mesmas. Os biólogos, de fato, já estão tentando exprimir a genética dos organismos na forma de programas de computador. A luta pela sobrevivência selecionaria determinadas características dos organismos, cada vez mais velozmente, de geração em geração. Surgiriam, assim, os organismos adaptados para viver em Marte. Nessa seqüência, o primeiro objetivo seria extrair dióxido de carbono da atmosfera e do solo rochoso. Junto com a água, liquefeita pelo calor adicional, substâncias constituiriam um ambiente parecido com o da Terra. Em apenas quarenta anos, o trabalho de jardinagem planetária imaginado pelo escritor Frederick Turner terá tornado Marte um agradável lugar. Em alguns pontos de Marte, a cor do céu tende ao púrpura. A bela cor vermelha de Marte, associada ao sangue, talvez explique por que gregos e romanos o tinham na conta de deus da guerra e pode, também, ter ajudado a transformá-lo em um mito. Marte, mais do que qualquer outro planeta, é bastante parecido com a Terra. Está apenas 50% mais distante do Sol do que a Terra e seu ano dura aproximadamente o dobro do ano terrestre.

Neoliberalismo e Educação - Pablo Gentilli

PABLO GENTILI: NEOLIBERALISMO E EDUCAÇÃO: MANUAL DO USUÁRIO
Neste trabalho pretendo abordar criticamente algumas dimensões da configuração do discurso neoliberal no campo educacional. Começarei destacando a importância teórica e política de se compreender o neoliberalismo como um complexo processo de construção hegemônica. Isto é, como uma estratégia de poder que se implementa sentidos articulados: por um lado, através de um conjunto razoavelmente regular de reformas concretas no plano econômico, político, jurídico, educacional, etc. e, por ou através de uma série de estratégias culturais orientadas a impor novos diagnósticos acerca da crise e construir novos significados sociais a partir dos quais legitimar as reformas neoliberais como sendo as únicas que podem (e devem) ser aplicadas no atual contexto histórico de nossas sociedades Tentarei mostrar de que forma esta dimensão cultural, característica de toda lógica hegemônica, foi sempre reconhecida como um importante espaço de construção política por aqueles intelectuais conservadores que, em meados deste século, começaram a traçar as bases teóricas e conceituada do neoliberalismo enquanto alternativa de poder. Em segundo lugar, tentarei apresentar algumas considerações gerais sobre como se constrói a retórica neoliberal no campo educacional. Pretendo identificar as dimensões que unificam os discursos neoliberais para além das particularidades locais que caracterizam os diferentes contextos regionais onde tal retórica é aplicada. Meu objetivo será questionar a forma neoliberal de pensar e projetar a política educacional. Finalizo destacando algumas das mais evidentes conseqüências da pedagogia da exclusão promovida pelos regimes neoliberais em nossas sociedades.'
1. O neoliberalismo como construção hegemônica
Explicar o êxito do neoliberalismo (é também, é claro, traçar estratégias para sua necessária derrota) é uma tarefa cuja complexidade deriva da própria natureza hegemônica desse projeto. Com efeito, o neoliberalismo expressa a dupla dinâmica que caracteriza todo processo de construção de hegemonia. Por um lado, trata-se de uma alternativa de poder extremamente vigorosa constituída por uma série de estratégias políticas, econômicas e jurídicas orientadas para encontrar uma saída dominante para a crise capitalista que se inicia ao final dos anos 60 e que se manifesta claramente já nos anos 70. Por outro lado, ela expressa e sintetiza um ambicioso projeto de reforma ideológica de nossas sociedades a construção e a difusão de um novo senso comum que fornece coerência, sentido e uma pretensa legitimidade às propostas de reforma impulsionadas pelo bloco dominante. Se o neoliberalismo se transformou num verdadeiro projeto hegemônico, isto se deve ao fato de ter conseguido impor uma intensa dinâmica de mudança material e, ao mesmo tempo, uma não menos intensa dinâmica de reconstrução discursivo-ideológica da sociedade, processo derivado da enorme força persuasiva que tiveram e estão tendo os discursos, os diagnósticos e as estratégias argumentativas, a retórica, elaborada e difundida por seus principais expoentes intelectuais (num sentido gramsciano, por seus intelectuais orgânicos. O neoliberalismo deve ser compreendido na dialética existente entre tais esferas, as quais se articulam adquirindo mútua coerência.
Com frequência costumamos enfatizar a capacidade (ou a incapacidade) que o neoliberalismo possui para impor com êxito seus programas de ajuste, esquecendo a conexão existente entre tais programas e a construção desse novo senso comum a partir do qual as maiorias começam aceitar , a defender como próprias) as receitas elaboradas pelas tecnocracias neoliberais. O êxito cultural mediante a imposição de um novo discurso que explica a crise e oferece um marco geral de respostas e estratégias para sair dela - se expressa na capacidade que os neoliberais tiveram de impor suas verdades como aquelas que devem ser defendidas por qualquer pessoa medianamente sensata e responsável. Os governos neoliberais não só transformam materialmente a realidade econômica, política, jurídica e social, também conseguem que esta transformação seja aceita como a única saída possível (ainda que, às vezes, dolorosa) para a crise.
Desde muito cedo, os intelectuais neoliberais reconheceram que a construção desse novo senso comum (ou, em certo sentido, desse novo imaginário social) era um dos desafios prioritários para garantir o êxito na construção de uma ordem social regulada pelos princípios do livre-mercado e sem a interferência sempre perniciosa da intervenção estatal. Não se tratava só de elaborar receitas academicamente coerentes e rigorosas, mas, acima de tudo, de conseguir que tais fórmulas fossem aceitas, reconhecidas e válidas pela sociedade como a solução natural para antigos problemas estruturais.
As obras de Friedrich A. Hayek e Milton Friedman, dois dos mais respeitados representantes da intelligentsia neoliberal, expressa com eloqüência, e por diferentes motivos, esta preocupação. Seus textos de intervenção política nos permitem observar a sagacidade desses intelectuais em reconhecer a importância política de acompanhar toda reforma econômica com uma necessária" mudança nas mentalidades, na cultura dos povos.
Em seu prefácio de 1976 a The Road to Serfdom (O caminho da servidão), Hayek lamentava que as idéias defendidas naquele texto fundacional, editado originariamente em 1944, continuassem, trinta anos depois, mantendo plena vigência, embora a prédica "intervencionista e coletivista' da social-democracia gozasse de boa saúde e relativa popularidade entre as maiorias. Passadas mais de três décadas, a sociedade ainda não tinha aceito plenamente o que para Hayek era uma evidência ineludível: toda forma de intervenção estatal constitui um sério risco para a liberdade individual e o caminho mais seguro para a imposição de regimes totalitários corno o da Alemanha nazista e o da União Soviética comunista. Trinta anos depois, o desafio de O caminho da servidão continuava aberto: só quando a sociedade reconhece o verdadeiro desafio da liberdade é possível evitar as armadilhas do coletivismo. Hayek não deixava margem a dúvidas sobre as conseqüências que derivavam de uma cultura mais disposta a reconhecer a necessidade da intervenção estatal que os méritos do livre-mercado. Se o homem comum não afirma na sua vida cotidiana o valor da competição, se a sociedade não aceita as enormes possibilidades modernizadoras que o mercado oferece quando passa a atuar sem a prejudicial interferência do Estado, as conseqüências - defendia o intelectual austríaco - são nefastas para a própria democracia: os piores serão os primeiros, o totalitarismo aumentará e a planificação centralizada tomará conta da vida das pessoas, impedindo-lhes de expressar seus desejos individuais, sua vocação de melhora contínua, sua liberdade de escolher. Hitler, Stalin e Mussolini não expressavam um ocasional desvio totalitário na história dos povos europeus, eram o espelho onde deveriam mirar-se aqueles líderes políticos que ainda confiavam na suposta eficácia da planificação estatal centralizada.
Poucos anos depois, Milton Friedman enfrentava um panorama menos desolador. Seu livro Free to Choose (Liberdade de Escolher), publicado no início dos anos oitenta, tinha vendido rapidamente, nos Estados Unidos, mais de 400.000 exemplares em sua edição de luxo e várias centenas de milhares em sua edição popular. O principal expoente da Escola de Chicago se perguntava sobre as razões do incrível êxito este volume, sobretudo se comparado à "tímida" recepção que havia tido Capitalism and Freedom (Capitalismo e Liberdade), seu antecedente mais direto, embora publicado vinte anos antes. Por que Liberdade de Escolher tinha vendido em apenas poucas semanas o que Capitalismo e Liberdade vendeu durante vinte longos anos? Como explicar semelhante fato, se os dois livros abordavam a mesma problemática e defendiam as mesmas idéias? O espetacular impacto de Free to Choose, segundo o próprio Friedman, não podia ser exclusivamente atribuído à difusão alcançada pela série televisiva de mesmo nome que acompanhou o lançamento do livro e que o teve como protagonista. Antes disso, existia uma mudança mais profunda: a opinião pública havia mudado, as pessoas estavam mais receptivas à prédica insistente dos defensores do livre-mercado; as pessoas, agora estavam alertas para se defenderem da voracidade de um Estado disposto a monopolizar tudo, inclusive o bem mais apreciado pelo ser humano a liberdade individual. Em seu prefácio) de 1982 à nova edição de Capitalism and Freedom, Milton Friedman reconhecia satisfeito: 411 as idéias expostas e nonos dois livros ainda se acham muito distantes da corrente intelectual predominante, mas agora, pelo menos, respeitadas pela comunidade intelectual e parece que se tornaram quase comuns entre o grande público" (l985: 6), Margaret Thatcher já era Primeira Ministra da Inglaterra e Ronald Reagan, Presidente dos Estados Unidos. Helmut Khol acabara de ganhar as eleições na Alemanha... o neoliberalismo se transformava em uma verdadeira alternativa de poder no interior das principais potências do mundo capitalista.
Obviamente, a penetração social desses discursos não foi produto do acaso nem apenas uma questão decorrente dos méritos intelectuais daqueles obstinados professores universitários. Será no contexto da intensa e progressiva crise estrutural do regime de acumulação fordista que a retórica neoliberal ganhará espaço político e também, é claro, densidade ideológica. Tal contexto oferecerá a oportunidade necessária para que se produza esta confluência histórica entre um pensamento vigoroso no plano filosófico e econômico (embora, até então, de escasso impacto tanto acadêmico quanto social) e a necessidade política do bloco dominante de fazer frente ao desmoronamento da fórmula keynesiana cristalizada nos Estados de Bem-estar. A intersecção de ambas as dinâmicas permite compreender a força hegemônica do neoliberalismo.
Estes processos tiveram também eu impacto específico na América Latina. Com efeito, alguns países da região constituíram um verdadeiro laboratório de experimentação neoliberal de resultados aparentemente milagrosos. A América latina, de fato, foi o cenário trágico do primeiro experimento político do neoliberalismo em nível mundial: a dita dura do general Pinochet iniciada no Chile em 1973.
Entretanto, a contribuição latino-americano ao neoliberalismo mundial não se esgotou na experiência chilena. Durante os anos 80, e no contexto das incipientes democracias pós-ditatoriais, o neoliberalismo chegará ao poder, na maioria das nações da região, pela via do voto popular. Algumas experiências, inclusive, transcenderam as fronteiras como modelos "exitosos" capazes de iluminar (de forma quase universal) o caminho de uma verdadeira e profunda reforma econômica, a partir da qual garantir a estabilidade monetária e política, a partir da qual garantir uma suposta governabilidade democrática. Durante a segunda metade do século XX, o neoliberalismo deixou, assim, de ser apenas uma simples perspectiva teórica produzida em confrarias intelectuais, a orientar as decisões governamentais em grande parte do mundo capitalista, o que inclui desde as nações do Primeiro e do Terceiro Mundo até algumas das mais convulsionadas sociedades da Europa Oriental.
Cinco décadas de história teórica e quase vinte anos de experiência no exercício do poder permitem-nos identificar mais regularidades que, para além das especificidades locais, contribuem para a definição da natureza e do caráter dos programas de ajuste neoliberal num sentido global. Na seguinte, nosso interesse se concentrará nas regularidades apresentadas pela retórica neoliberal no campo educacional. Resumiremos a seguir algumas dimensões discursivas que configuram esta retórica, a partir da qual são elaboradas uma série de diagnósticos e, consequentemente, uma série de propostas políticas que devem, sob a perspectiva neoliberal, orientar uma profunda reforma do sistema escolar nas sociedades contemporâneas. Pretendo, desta forma, contribuir para a necessária tarefa de caracterizar a forma neoliberal de pensar e projetar as políticas . A possibilidade de conhecer e reconhecer a discursiva do neoliberalismo obviamente não é suficiente para freiar a força persuasiva de sua retórica. No entanto pode ajudar-nos a desenvolver mais e melhores estratégias de luta contra as intensas dinâmicas de exclusão social promovidas por tais políticas. Pretendo aqui contribuir minimamente para esse objetivo.
Podemos nós aproximar de uma compreensão crítica da forma neoliberal de pensar e traçar a política educacional procurando responder, brevemente, a quatro questões:
1. como entendem os neoliberais a crise educacional?
2. quem são, de acordo com essa perspectiva, seus culpados?
3. que estratégias definem para sair dela?
4. quem deve ser consultado para encontrar uma saída para a crise?
Em primeiro lugar é necessário destacar que na perspectiva neoliberal os sistemas educacionais enfrentam, hoje, uma profunda crise de eficiência, eficácia e produtividade, mais do que uma crise de quantidade, universalização e extensão.
Para eles, o processo de expansão da escola, durante a segunda metade do século, ocorreu de forma acelerada sem que tal crescimento tenha garantido uma distribuição eficiente dos serviços oferecidos. A crise das instituições escolares é produto, segundo este enfoque, da expansão desordenada e "anárquica" que o sistema educacional vem sofrendo nos últimos anos. Trata-se fundamentalmente de uma crise de qualidade decorrente da improdutividade que caracteriza as práticas pedagógicas e a gestão administrativa da grande maioria dos estabelecimentos escolares.
Neste sentido, a existência de mecanismos de exclusão e discriminação educacional resulta de forma clara e direta, da própria ineficácia da escola e da profunda incompetência daqueles que nela trabalham. Os sistemas educacionais contemporâneos não enfrentam, sob a perspectiva neoliberal, uma crise de democratização, mas uma crise gerencial. Esta crise promove, em determinados contextos, certos mecanismos de "iniqüidade" escolar, tais como a evasão, a repetência, o analfabetismo funcional etc.
O objetivo político de democratizar a escola está assim subordinado ao reconhecimento de que tal tarefa depende, inexoravelmente, da realização de uma profunda reforma administrativa do sistema escolar orientada pela necessidade de introduzir mecanismos que regulem a eficiência, a produtividade, a eficácia, em suma: a qualidade dos serviços educacionais.
Deste diagnóstico inicial decorre um argumento central na retórica construída pelas tecnocracias neoliberais: atualmente, inclusive nos países mais pobres, não faltam escolas, faltam escolas melhores; não faltam professores,, faltam professores mais qualificados; não faltam recursos para financiar as políticas educacionais, ao contrário, falta uma melhor distribuição dos recursos existentes. Sendo assim, transformar a escola supõe um enorme desafio gerencial: promover uma mudança substantiva nas práticas pedagógicas, tornando-as mais eficientes; reestruturar o sistema para flexibilizar a oferta educacional; promover urna mudança cultural, não menos profunda, nas estratégias de gestão (agora guiadas pelos novos conceitos de qualidade total); reformular o perfil dos professores, requalificando-os, implementar uma ampla reforma curricular, etc.
Segundo os neoliberais, esta crise se explica, em grande medida, pelo caráter estruturalmente ineficiente do Estado para gerenciar as políticas públicas. O clientelismo, a obsessão planificadora e os improdutivos, labirintos do burocratismo estatal explicam, sob a perspectiva neoliberal, a incapacidade que tiveram os governos para garantir a democratização da educação e, ao mesmo tempo", a eficiência produtiva da escola. A educação funciona mal porque foi malcriadamente peneirada pela política, porque foi profundamente estatizada. A ausência de um verdadeiro mercado educacional permite compreender a crise de qualidade que invade as instituições escolares. Construir tal mercado, conforme veremos mais adiante, constitui um dos grandes desafios que as políticas neoliberais assumirão no campo educacional. Só esse mercado, cujo dinamismo e flexibilidade expressam o avesso de um sistema escolar rígido e incapaz, pode promover os mecanismos fundamentais que garantem a eficácia e a eficiência dos serviços oferecidos: a competição interna e o desenvolvimento de um sistema de prêmios e castigos com base no mérito e no esforço individual dos atores envolvidos na atividade educacional. Não existe mercado sem concorrência, sendo ela o pré-requisito fundamental para garantir aquilo que os neoliberais chamam de eqüidade.
A planificação centralizada e, certamente, o clientelismo que caracteriza as práticas estatais impedem e travam a liberdade individual de eleger, única garantia para o estabelecimento de um sistema de prêmios e castigos baseado em critérios verdadeiramente meritocráticos. Para os neoliberais, o Estado de Bem-estar e as diversas formas de populismo que conheceram nossos países têm intensificado os efeitos improdutivos que se derivam da materialização histórica destas práticas clientelistas. Ao criticar enfaticamente a interferência política na esfera social, econômica e cultural, o neoliberalismo questionar a própria noção de direito e a concepção de igualdade que serve(ao menos teoricamente) como fundamento filosófico da existência de uma esfera de direitos sociais nas sociedades democráticas. Tal questionamento supõe, na perspectiva neoliberal, aceitar que uma sociedade pode ser democrática sem a existência de mecanismos e critérios que promovem uma progressiva igualdade e que se concretizam na existência de um conjunto inalienável de direitos sociais e de uma série de instituições públicas nas quais tais direitos se materializam.
Para os neoliberais a democracia não tem nada a ver com isso. Ela é simplesmente , um sistema político que deve permitir aos indivíduos desenvolver sua inesgotável capacidade de livre escolha na única esfera que garante e potencializa a referida capacidade individual: o mercado. A crise social se deriva, fundamentalmente, de que os sistemas institucionais dependentes da esfera do Estado (da política) não atuam eles mesmos como mercados. Isto ocorre, segundo a perspectiva neoliberal, no campo da saúde, da previdência, das políticas de emprego e também, é claro, da educação.
De certa forma, a crise é produto da difusão (excessiva, aos olhos de certos neoliberais atentos) da noção de cidadania. Para eles, o conceito de cidadania em que se baseia a concepção universal e universalizante dos direitos humanos (políticos, sociais, econômicos, culturais etc.) tem gerado um conjunto de falsas promessas que orientaram ações coletivas e individuais caracterizadas pela improdutividade e pela falta de reconhecimento social no valor individual da competição.
Com efeito, como já tentei demonstrar em outros trabalhos, a grande operação estratégica do neoliberalismo consiste em transferir a educação da esfera da política para a esfera do mercado questionando assim seu caráter de direito e reduzindo-a a sua condição de propriedade. É neste quadro que se reconceitualiza a noção de cidadania, através de uma revalorização da ação do indivíduo enquanto proprietário, enquanto indivíduo que luta para conquistar (comprar) propriedades-mercadorias diversa índole, sendo a educação uma delas. O modelo de homem neoliberal é o cidadão privatizado o entrepreneur, o consumidor.
2. Os culpados
Sendo assim, é relativamente fácil avançar na resposta à nossa segunda pergunta: (quem são os culpados pela crise educacional? Existem, desta perspectiva alguns responsáveis diretos e outros indiretos. Entre os primeiros se encontram, obviamente, o modelo de Estado assistencialista e uma das configurações institucionais que o tem caracterizado: os sindicatos. A existência de fortes sindicatos nacionais e organizados em função de grandes setores de atividade, os quais proclamam a defesa de um interesse geral baseado na necessidade de construir e expandir a esfera dos direitos sociais, constitui, na perspectiva neoliberal, uma barreira intransponível para a possibilidade de desenvolver os já mencionados mecanismos de competição individual que garantem o progresso social. Nesse sentido os principais responsáveis pela crise educacional se encontram os próprios sindicatos de professores e todas aquelas organizações que defendem o direito igualitário a uma escola pública de qualidade. Entretanto, semelhante argumento apresenta um problema evidente. Com efeito, se o Estado e os sindicatos são os principais responsáveis pela crise, deveria supor-se que a simples redução do primeiro à sua mínima expressão e a desaparição definitiva dos segundos constituem uma garantia mais do que suficiente para superar a crise atual das instituições educacionais. Da perspectiva neoliberal isso e, o menos em parte, efetivamente assim. Porém, mesmo quando os neoliberais chegam o poder e desenvolvem (muitas vezes com êxito) sua implacável desarticulação dos mecanismos de intervenção do Estado, e sua não menos implacável fragmentação das organizações sociais, nem sempre a crise educacional se soluciona.
Na perspectiva neoliberal, isto acontece porque a crise educacional não se reduz apenas à existência de um certo modelo de Estado, nem ao caráter supostamente corporativo das entidades sindicais. O problema é mais complexo: os indivíduos são também culpados pela crise. e é culpada na medida em que as pessoas ajeitaram corno natural e inevitável o status quo estabelecido por aquele sistema improdutivo de intervenção estatal. Os pobres são culpados pela pobreza; os desempregados pelo desemprego; os corruptos pela corrupção; os faceados pelas violência urbana; os sem-terra pela violência no campo; os pais pelo rendimento escolar de seus filhos; os professores pela péssima qualidade dos serviços educacionais. O neoliberalismo privatiza tudo, inclusive também o êxito e o fracasso social. Ambos passam a ser considerados variáveis dependentes de um conjunto de opções individuais através das quais as pessoas jogam dia a dia seu destino, como num jogo de baccarat. Se a maioria dos indivíduos é responsável por um destino não muito gratificante é porque não souberam reconhecer as vantagens que oferecem o mérito e o esforço individuais através dos quais se triunfa na vida. É preciso competir, e uma sociedade moderna é aquela na qual só os melhores triunfam. Dito de maneira simples: a escola funciona mal porque as pessoas não reconhecem o valor do conhecimento; os professores trabalham pouco e não se atualizam, são preguiçosos; os alunos fingem que estudam quando, na realidade, perdem tempo, etc.
Trata-se, segundo os neoliberais, de um problema cultural provocado pela ideologia dos direitos sociais e a falsa promessa de que uma suposta condição de cidadania nos coloca a todos em igualdade de condições para exigir o que só deveria ser outorgado àqueles que, graças ao mérito e ao esforço individual, se consagram como consumidores empreendedores.
A lógica competitiva promovida por um sistema de prêmios e castigos com base em tais critérios meritocráticos cria as condições culturais que facilitam uma profunda mudança institucional voltada para a Configuração de um verdadeiro mercado educacional. Superar a crise implica, então, o desafio de traçar as estratégias mais eficientes a partir das quais é possível construir tal mercado. Passemos a seguir para a terceira questão.
3. As estratégias
As políticas educacionais implementadas elas administrações neoliberais permitem reconhecer uma série de regularidades que, para além das especificidades locais, caracterizam e unificam as estratégias de reforma escolar levadas a cabo por esses governos. Poderíamos dizer que existe um consenso estratégico entre os, intelectuais conservadores sobre como e com que receitas enfrentar a crise educacional. Obviamente, tal consenso decorre da formulação de um diagnóstico comum partir do qual é possível explicar e descrever os motivos que originaram a crise e, ao mesmo tempo, de uma identificação também comum sobre os supostos responsáveis por essa crise. A experiência internacional parece indicar a existência de um Consenso de Washington,, também no plano de reforma educacional. Na construção desse consenso desempenharam um papel central as agências internacionais, em especial, o Banco Mundial e, mais recentemente, uma série de intelectuais transnacionalizados (os experts) que, assumindo um papel pretensamente evangelizador, percorrem o mundo vendendo seus papers pré-fabricados a quem mais lhes oferecer. Retornaremos a esses mais adiante.
Essas regularidades se expressam em uma série d objetivos que articulam e dão coerência às reformas educacionais implementadas pelos governos neoliberais:
a) por um lado, a necessidade de estabelecer mecanismos de controle e avaliação da qualidade dos serviços educacionais (na ampla esfera dos sistemas e, de maneira específica, no interior das próprias instituições escolares)
b) por outro, a necessidade de articular e subordinar produção educacional às necessidades estabelecidas pelo mercado de trabalho.
O primeiro objetivo promove e, de certa forma, garante a materialização dos citados princípios meritocráticos competitivos. O segundo dá sentido e estabelece o rumo(o horizonte) das políticas educacionais, ao mesmo tempo que permite estabelecer critérios para avaliar a pertinência das propostas de reforma escolar. É o mercado de trabalho que emite os sinais que permitem orientar as decisões em matéria de política educacional. É a avaliação das institu)ições escolares e o estabelecimento de rigorosos critérios de qualidade o que permite dinamizar o sistema através de uma lógica de prêmios e castigos que estimulam a produtividade e a eficiência no sentido anteriormente destacado.
Não vamos desenvolver aqui as características e o conteúdo que assumem essas estratégias de reforma. No entanto, é importante especificar brevemente duas questões relevantes vinculadas a tais objetivos. O neoliberalismo formula um conceito específico de qualidade, decorrente das práticas empresariais é transferido, sem mediações, para o campo educacional. As instituições escolares devem ser pensadas e avaliadas (isto é, devem julgados seus resultados), como se fossem em presas Produtivas. Produz-se nelas um tipo específico de mercadoria (o conhecimento, o aluno escolarizado, o currículo) e, conseqüentemente, suas práticas devem estar submetidas aos mesmos critérios de avaliação que se aplicam em toda empresa dinâmica, eficiente e flexível. Se os sistemas de Total Quality Control (TQC) têm demonstrado um êxito comprovado no mundo dos negócios, deverão produzir os mesmos efeitos produtivos no campo educacional.
Por outro lado, é importante destacar que quando os neoliberais enfatizam que a educação deve estar subordinada às necessidades do mercado de trabalho, estão se referindo a uma questão muito específica: a urgência de que o sistema educacional se ajuste às demandas do mundo dos empregos. Isto não significa que a função social da educação seja garantir esse empregos e, menos ainda, criar fontes de trabalho. Pelo contrário, o sistema educacional deve promover o que os neoliberais chamam de empregabilidade.
Isto é, a capacidade flexível de adaptação individual às demandas do mercado de trabalho. A função "social" da educação esgota-se neste ponto. Ela encontra o seu preciso limite no exato momento em que o indivíduo se lança ao mercado para lutar por um emprego. A educação deve apenas oferecer essa ferramenta necessária para competir nesse mercado. O restante depende das pessoas. Como no jogo de baccarat do qual nos fala Friedman, nada está aqui determinado de antemão, embora saibamos, que alguns triunfarão e outros estarão condenados ao fracasso.
Uma dinâmica aparentemente paradoxal caracteriza a estratégias de reforma educacional promovidas pelos governos neoliberais: as lógicas articuladas de descentralização centralizante e de centralização-descentralizada. De fato por um lado, as estratégias neoliberais contra a crise educacional se configuram como uma clara resposta descentralizadora diante dos supostos perigos do planejamento estatal e dos efeitos improdutivos das burocracias governamental e sindicais. Transferem-se as instituições escolares da jurisdição federal para a estadual e desta para a esfera municipal: municipaliza-se o sistema de ensino. Propõe-se para níveis cada vez mais micro (inclusive a própria escola), evitando-se, assim, interferência "perniciosa" do centralismo governamental; desarticulam-se os mecanismos unificados de negociação com organizações dos trabalhadores da educação (dinâmica que tende a questionar a própria necessidade das entidades sindicais; flexibilizam-se as formas de contratação e retribuições salariais dos docentes, etc.
Mas, por outro lado e ao mesmo tempo, os governos neoliberais centralizam certas funções, as quais não são transferidas aos municípios, aos governos estaduais nem, muito menos, aos próprios professores ou à comunidade:
a) a necessidade de desenvolver sistemas nacionais de avaliação dos sistemas educacionais(basicamente provas de rendimento aplicadas à população estudantil);
b) a necessidade de desenhar e desenvolver reformas curriculares a partir das quais estabelecer os parâmetros e conteúdos básicos de um Currículo Nacional;
c) associada à questão anterior a necessidade de desenvolver estratégias de formação de professores centralizadas nacionalmente e que permitam atualização dos docentes segundo o plano curricular estabelecido na citada reforma.
O Estado neoliberal é mínimo quando deve financiar a escola pública e máximo quando define de forma centralizada o conhecimento oficial que deve circular pelos estabelecimentos educacionais, quando estabelece mecanismos verticalizados e antidemocráticos de avaliação do sistema e quando retira autonomia pedagógica às instituições e aos atores coletivos da escola, entre eles, principalmente, aos professores. Centralização e descentralização são as duas faces de uma mesma moeda: a dinâmica autoritária que caracteriza as reformas educacionais implementadas pelos governos neoliberais.
Para compreender um pouco melhor a natureza da mudança institucional promovida pelo neoliberalismo nos âmbitos escolares, farei um pequeno parêntese. Estabelecerei, a título ilustrativo, uma analogia entre as funções atribuídas às instituições educacionais e a lógica que regula o funcionamento dos fast foods nas modernas sociedades de mercado. Esta comparação poderá nos permitir avançar na caracterização de um processo que denominaremos aqui mcdonaldização da escola e que, na minha perspectiva, sintetiza de forma eloqüente o sentido assumido pela reforma neoliberal levada a cabo nos âmbitos educacionais.
3. 1. A mcdonaldização da escola
Os processos de mcdonaldização têm sido destacados por alguns autores para referir-se à transferência dos princípios que regulam a lógica de funcionamento dos fast foods a espaços institucionais cada vez mais amplos na vida social do capitalismo contemporâneo. A mcdonaldização da escola, processo que se concretiza em diferentes e articulados planos (alguns mais gerais e outros mais específicos), constitui uma metáfora apropriada para caracterizar as formas dominantes de reestruturação educacional propostas pelas administrações neoliberais.
Na ofensiva antidemocrática e excludente promovida pelo ambicioso programa de reformas estruturais impulsionado pelo neoliberalismo, as instituições educacionais tendem a ser pensadas e reestruturadas sob o modelo de certos padrões produtivistas e empresariais.
Já temos enfatizado que os neoliberais definem um conjunto de estratégias dirigidas a transferir a educação da esfera dos direitos sociais à esfera do mercado. A ausência de um verdadeiro mercado educacional (isto é, a ausência de mecanismos de regulação mercantil que configurem as bases de um mercado escolar) explica a crise de produtividade da escola. Para os neoliberais, o reconhecimento desse fato permite orientar urna saída estratégica mediante a qual é possível conquistar, sem "falsas promessas", uma educação de qualidade e vinculada às necessidades do mundo moderno: as instituições escolares devem funcionar como empresas produtoras de serviços educacionais. A interferência estatal não pode questionar o direito de livre escolha que os consumidores de educação devem realizar no mercado escolar. Apenas um conglomerado de instituições corri essas características pode obter níveis de eficiência baseados na competição e no mérito individual. Os McDonald's constituem um bom exemplo de organização produtiva com tais atributos e, nesse sentido, representam um bom modelo organizacional para a modernização escolar. Vejamos algumas das possíveis coincidências entre ambas as esferas. Em primeiro lugar, os fast foods, e as escolas têm um ponto básico em comum. Ambos existem para dar conta de duas necessidades fundamentais nas sociedades modernas: comer e ser socializado escolarmente. Embora a primeira seja uma necessidade tão antiga quanto a própria Humanidade e a segunda nem tanto, não existiria, aparentemente, nenhuma originalidade nas funções que atualmente são cumpridas tanto pelos McDonald's quanto pelas escolas. Entretanto, aqui, como na produção de toda mercadoria, o importante não é apenas a coisa produzida (o hambúrguer ou o conhecimento oficial), mas a forma histórica que adquire a produção desses processos, quer se trate da indústria da comida rápida, quer se trate da indústria escolar. Isto é, o que unifica os McDonalds e a utopia educacional dos homens de negócios é que, em ambos, a mercadoria oferecida deve ser produzida de forma rápida e de acordo com certas e rigorosas normas de controle da eficiência e da produtividade. O modelo McDonald's tem demonstrado, graças à universalização do hambúrguer, uma enorme capacidade para ter sucesso no mercado da alimentação "rápida" (se é que o termo "alimentação" pode ser aplicado nesse caso). A escola, pelo contrário, no que se refere a suas funções educacionais, não tem sido tão bem sucedida, se avaliada sob a ótica empresarial defendida pelos neoliberais. Os princípios que regulam a prática cotidiana dos McDonald's, em todas as cidades do planeta, bem que poderiam ser aplicados às instituições escolares que pretendem percorrer a trilha da excelência: "qualidade, serviço, limpeza e preço". A rigor na perspectiva dos homens de negócios, esses princípios devem regular toda prática produtiva moderna. O próprio fundador dessa cadeia de restaurantes, Ray Kroc, tem dito, sem falsa modéstia: "se me tivessem dado um tijolo cada vez que repeti essas palavras, creio que teria podido construir uma ponte sobre o Oceano Atlântico" (Peter & Waterman, 1984: 170). A escola, pensada e projetada como uma instituição prestadora de serviços, deve adotar esses princípios de demonstrada eficácia para obter certa liderança em qualquer mercado.
Esse aspecto de caráter geral se vincula a outra coincidência (ou melhor, a outra lição) que os McDonald's oferecem às instituições educacionais. De forma bastante simples, podemos dizer que os fast foods surgiram para responder a uma demanda da sociedade moderna pós-industrial: as pessoas correm muito; estão, em grande parte do dia, fora de casa; e têm pouco tempo para comer. Entre os fast foods realmente existentes, o McDonald's adquiriu liderança mundial, aproveitando-se daquilo que na terminologia empresarial se denomina "vantagens comparativas". Uma grande capacidade administrativa permitiu que essa empresa conquistasse uni importante nicho no mercado da comida rápida. Algumas das correntes dominantes entre as perspectivas acadêmicas dos homens de negócios enfatizam que a capacidade competitiva de uma empresa (e inclusive de uma nação) se define por seu dinamismo e flexibilidade para descobrir e ocupar determinados segmentos (ou nichos) que se abrem à competição empresarial. Assim, os mercados expressam tendências e necessidades heterogêneas. Reconhecer tal diversidade faz parte da habilidade empresarial daqueles que conduzem as grandes corporações conseguem sobreviver à intensa competição inter-empresarial. O que é tudo isso tem a ver com a educação? A resposta é simples: se o sistema escolar tem que se configurar como mercado educacional, as escolas devem definir estratégias competitivas para atuar em tais mercados, conquistando nichos que respondam de forma específica à diversidade existente nas demandas de consumo por educação. Mcdonaldizar, a escola supõe pensá-la como urna instituição flexível que deve reagir aos estímulos (os sinais) emitidos por um mercado educacional altamente competitivo.
Entretanto, alguém, provavelmente intrigado, poderia perguntar qual é a razão que explica que o mercado educacional deva ser necessariamente competitivo. Os neoliberais respondem a essa questão também de forma simples: assim como as pessoas precisam comer hambúrgueres porque o trabalho (e, claro, a mídia) o exige, também precisam educar-se porque o conhecimento se transformou na chave de acesso à nova Sociedade do saber. Na perspectiva dos homens de negócios, nesse novo modelo de sociedade, a escola deve ter por função a transmissão de certas competências e habilidades necessárias para que as pessoas atuem competitivamente num mercado de trabalho altamente seletivo e cada vez mais restrito. A educação escolar deve garantir as funções de classificação e hierarquização dos postulantes aos futuros empregos (ou aos empregos do futuro). Para os neoliberais, nisso reside a "função social da escola". Semelhante "desafio" só pode ter êxito num mercado educacional que seja, ele próprio, uma instância de seleção meritocrática, em suma, um espaço altamente competitivo.
A necessidade de permitir a competição inter-institucional (escola versus escola) explica a ênfase neoliberal no desenvolvimento de mecanismos de desregulamentação, flexibilização da oferta e livre escolha dos consumidores na esfera educacional. Entretanto, essa questão não esgota a reforma competitiva que os neoliberais pretendem impor na esfera escolar. Nessa perspectiva, a competição deve caracterizar a própria lógica interna das instituições educacionais. A possibilidade de construção de um mercado escolar competitivo depende, entre outros fatores, da difusão de rigorosos critérios de competição interna que regulem as práticas e as relações cotidianas da escola. Algo similar ocorre nos McDonald's.
De fato, os sistemas de controle e promoção de pessoal no McDonald's são conhecidos (e em muitas ocasiões tomados como modelos) pelo uso eficaz de um sistema de incentivos que promove uma dura e implacável competição interna entre os trabalhadores bem como a difusão de um sistema de prêmios e castigos dirigidos a motivar o "pertencimento" e a adesão incondicional à empresa. Esses mecanismos estão sendo cada vez mais difundidos nos âmbitos escolares até mesmo quando as normas jurídicas vigentes não o permitem). Quem mais produz mais ganha. E só é possível saber quem mais produz quando se avaliam rigorosamente os atores envolvidos no processo pedagógico(sejam professores, alunos, funcionários etc.). Os prêmios à produtividade são, tal como no McDonald's, tanto meramente simbólicos(quadro de honra, empregado do mês), quanto materiais(aumento salarial, prêmios em espécie, promoção de categoria). A educação deve ser pensada como um grande campeonato. Nela, os triunfadores sabem que o primeiro desafio é assumirem-se como ganhadores. "Tu pertences à equipe dos campeões!", costuma repetir orgulhoso Ray Kroe em suas habituais arengas à sua tropa de despachantes de hambúrgueres e batatas fritas baratas. Espírito de luta, de auto-superação, de confiança no valor do mérito, certeza de saber que quem está ao nosso lado só atrapalha nosso caminho ao sucesso. Nada mais apreciado na escola do que o título de Mestre do Ano. Nada mais cobiçado no McDonald's do que o prêmio All American Hamburguer-Maker.
A pedagogia da Qualidade Total se inscreve nessa forma particular de compreender os processos educacionais, não sendo mais do que uma tentativa de transferir para a esfera escolar os métodos e as estratégias de controle de qualidade próprios do campo produtivo.
O processo de mcdonaldização da escola também tem seu efeito no campo do currículo e na formação de professores. Quem se aventurar a estudar com mais detalhes os fast foods(tarefa que constituiria uma grande contribuição para compreender melhor nossas escolas) poderá encontrar uma surpreendente similitude entre os mecanismos de planejamento dos cardápios nesse tipo de negócio e as estratégias neo-tecnicistas de reforma curricular. O caráter assumido pelo planejamento dos currículos nacionais, no contexto da reforma educacional promovida pelos regimes neoliberais poderia muito bem ser entendido como um processo de macdonaldização do conhecimento escolar.
Ao mesmo tempo, no contexto desses processos de modernização conservadora, as p políticas de formação de docentes vão se configurando como pacotes fechados de treinamento (definidos sempre por equipes de técnicos, experts e até consultores de empresas!) planejados de forma centralizada, sem participação dos grupos de professores envolvidos no processo de formação, e apresentando uma alta transferibilidade (ou seja, com grande potencial para serem aplicados em diferentes contextos geográficos e com diferentes populações) É essa, precisamente, uma das características que têm facilitado a expansão internacional de uma empresa como o McDonald's. Esse tipo de ernpresa tem tido um papel fundamental no desenvolvimento daquilo que poderíamos chamar aqui "pedagogia fast food": sistemas de treinamento rápido com grande poder disciplinador e altamente centralizados em seu planejamento e aplicação. A Hamburguer University de McDonald's em Chicago e sua competidora, a Harvard dos preparadores de batatas fritas, a Burger King University, na perspectiva dos homens de negócios, constituem invejáveis modelos de instituições educacionais de novo tipo. Assim, inclusive, aparecem tios manuais que estimulam o êxito empresarial, enfatizando o novo valor e a centralidade do conhecimento na sociedade do futuro. Formar um professor não costuma ser considerada uma tarefa mais complexa do que a de treinar um preparador de Hamburguer.
Por último, a mcdonaldização do campo educacional se expressa através das cada vez mais freqüentes formas de terceirização (pedagógica e não-pedagógica) que tendem a caracterizar o trabalho escolar nos programas de reforma propostos (e impostos) pelo neoliberalismo. Vejamos. Uma loja do McDonald's (suponhamos, em Moscou) é sempre um espaço de integração de diversos trabalhos parciais realizados em outras unidades produtivas. De certa forma, o Big Mac é a síntese "dialética de uma série de contribuições terceirizadas: por um lado, existe quem produz a carne, quem fabrica o pão, quem fornece o ketchup e, por outro, quem cultiva os pepinos. O McDonald's da Praça Vermelha simplesmente articula com a mesma eficiência e limpeza que o McDonald's da Quinta Avenida( em Nova York) esses insumos, os quais, todos juntos, dão origem a esse grande invento da cultura americana que são duas pequenas bolas achatadas de carne moída cujo suporte são dois pedaços de pão. O Big Mac só pode ser compreendido, a partir da perspectiva de um expert na indústria de hambúrgueres, como o resultado de uma criativa planificação centralizada e uma não menos criativa descentralização das funções exigidas para a elaboração de um produto cujos insumos são fornecidos por um número variável de produtores. A aplicação de uma série de rígidos controles de qualidade (também centralizados) garante uma alta produtividade, além da redução dos custos de produção e, em conseqüencia, um aumento da rentabilidade obtida por esses restaurantes. Essa racionalidade se aplica também ao campo educacional . A lógica do lucro e da eficiência penetra as administrações neoliberais. É nesse contexto que a terceirização do trabalho educacional constitui uma forma de mcdonaldizar a própria escola.
Alguém de espírito certamente apocalíptico poderia dizer, com razão, que a mcdonaldização da escola não se aplica a um dos atributos que tem caracterizado o notório crescimento dos fast foods nesta segunda metade do século X: sua progressiva universalização. Analisando as condições atuais do desenvolvimento capitalista, poderíamos suspeitar, com efeito, que os McDonald's têm melhor futuro o que a escola pública. Provavelmente, as vantagens comparativas dos fast foods permitirão que, em muitos de nossos países, os hambúrgueres e as batatas fritas se democratizem mais rapidamente do que o conhecimento. Entretanto, este é um problema de caráter especulativo que excede nossas possibilidades de reflexão? ao menos por enquanto.
O processo de mcdonaldização da escola deve ser considerado de forma "relacional". Não se trata de um fato isolado e arbitrário. Pelo contrário , ele só pode ser explicado no contexto do profundo processo de reestruturação política, econômica , jurídica e também, é claro, educacional que está ocorrendo no capitalismo de fim de século. A crise do fordismo e a configuração de um novo regime de acumulação pós-fordista permite entender . o caráter e a natureza das reformas impulsionadas pelos regimes neoliberais na esfera escolar. Na economia-rnundo capitalista se articulam novos mapas institucionais cuja geografia do benefício produz e reproduz novas e velhas formas de exclusão e desintegração social.
A escola não é alheia a esses processos; sua própria estrutura e funcionalidade é colocada em questionamento por tais dinâmicas. O processo mcdonaldização expressa essa mudança institucional dirigida a conformar as bases de uma escola toyotizada, uma escola de alto desempenho, a administrada pelos novos líderes gerenciais, os quais planejam formas de aprendizagem de novas habilidades exigidas por um local de trabalho reestrurado, formas que sejam "concretas", "práticas"", ligadas à vida real e organizadas através de equipes de trabalho (Wexler- 1995: 162).
De qualquer forma, é importante destacar que essa nova racionalidade do aparato escolar se constrói sobre aqueles princípios que regulavam a escola taylorista. Trata-se de um processo de reestruturação educacional onde se articulam novas e velhas dinâmicas organizacionais, onde se definem novas e velhas lógicas produtivistas através das quais a reforma escolar se reduz a uma série de critérios empresariais de caráter alienante e excludente.

4. Os sabichões
Tendo chegado a este ponto, procuraremos responder à nossa última pergunta: quem, na perspectiva neoliberal, deve ser consultado para poder superar a atual crise educacional? Poderíamos formular nossa pergunta de forma negativa: quem não deve ser consultado? A resposta é, em princípio, simples: os próprios culpados pela crise (especialmente, é claro, os sindicatos e aqueles "perdedores" que sofrem as conseqüências do infortúnio e a desgraça econômica por terem desconfiado do esforço e da perseverança meritocrática que permitem triunfar na vida, ou seja: as grandes maiorias). Defender e promover aquele velho e "improdutivo" modelo de Estado de Bem-Estar parece também não ser um bom caminho para superar a crise.
Quem, então, deve ser consultado? Quem pode nos ajudar a sair da crise? Obviamente, os exitosos: os homens de negócios. O raciocínio neoliberal é, neste aspecto, transparente: se os empresários souberam triunfar na vida (isto é, se souberam desenvolver-se com êxito no mercado) e o que está faltando em nossas escolas é justamente "concorrência", quem melhor do que eles para dar-nos as "dicas" necessárias para triunfar? O sistema educacional deve converter-se ele mesmo em um mercado.... devem então ser consultados aqueles que melhor entendem do mercado para ajudar-nos a sair da improdutividade e da ineficiência que caracterizam as práticas escolares e que regula a lógica cotidiana das instituições educacionais em todos os níveis. É nesse contexto que deve ser compreendida a atitude mendicante e cínica dos governantes que solicitam aos empresários "humanistas" a adoção de uma escola. Se cada empresário adotasse uma escola, o sistema educacional melhoraria de forma quase automática graças aos recursos financeiros que os "padrinhos" distribuiriam (doariam), bem como aos princípios morais que, vinculados a urna certa filosofia da qualidade total, da cultura do trabalho e idade do esforço individual, eles difundiriam na comunidade escolar.
No entanto, a questão não se esgota aqui. Em certo sentido, para os neoliberais, a crise envolve um conjunto de problemas técnicos (ou seja: pedagógicos) desconhecidos pelos empresários, mas que também devem ser resolvidos de forma eficiente. Assim, sair da crise pressupõe consultar os especialistas e técnicos competentes que dispõem do saber instrumental necessário para levar a cabo as citadas propostas de reforma: peritos em currículo, em formação de professores à distância, especialistas em tomadas de decisões com escassos recursos, sabichões reformadores do Estado, intelectuais competentes em redução do gasto público, doutores em eficiência e produtividade, etc. Alguém candidamente poderia perguntar-se de onde tirar tanta gente. A resposta a semelhante questão pode ser encontrada nos corredores dos Ministérios de educação de qualquer governo neoliberal: são os organismos internacionais (especialmente o Banco Mundial) os que fornecem todo tipo de especialistas nestas matérias. Para trabalhar nestes organismos, que não são precisamente de beneficência e ajuda mútua, basta fazer projetos que se retro-alimentem a si mesmos e, de preferência, ter sido de esquerda na puberdade profissional.
III. Conclusão
O aumento da pobreza e da exclusão conduzem à conformação de sociedades estruturalmente divididas nas quais, necessariamente, o acesso às instituições educacionais de qualidade e a permanência nas mesmas tende a transformar-se em um privilégio do qual gozam apenas as minorias. A discriminação educacional articula-se desta forma com os profundos mecanismos de discriminação de classe, de raça e gênero historicamente existentes em nossas sociedades. Tais processos caracterizam a dinâmica social assumida pelo capitalismo contemporâneo, apesar dos mesmos se) ) concretizarem com algumas diferenças regionais evidentes no contexto mais amplo do sistema mundial. De fato, o capitalismo avançado também tem sofrido a intensificação deste tipo de tendências no seio de sociedades aparentemente imunes ao aumento da pobreza, da miséria e da exclusão.
Dois processos decorrentes das políticas neoliberais produzem também um impacto direto na esfera das políticas educacionais: a dificuldade (ou, em alguns casos, a impossibilidade) de manter expandir mecanismos democráticos de governabilidade, e o aumento acelerado da violência. social, política e econômica contra os setores populares urbanos e rurais
Por outro lado, e ao mesmo tempo, a crescente difusão de intensas relações de Corrupção - sendo a corrupção política apenas uma das expressões mais eloqüentes deste processo - tende a criar as bases materiais e culturais um tecido social marcado pelo individualismo e pela ausência de mecanismos de solidariedade coletiva. O darwinismo social intensifica o processo de fragmentação e de divisão estrutural produzido no interior das sociedades neoliberais. A corrupção como problema que ultrapassa o âmbito da moral particular das elites políticas e econômicas, isto é, como lógica cultural, constitui um fator característico deste processo de desagregação e desintegração social. Tal lógica cultural penetra capilarmente em todas as instituições principalmente nas educacionais, as quais tendem a Converter-se em promotoras e difusoras desta nova forma de individualismo exacerbado.
Em suma, os governos neoliberais deixaram (e estão deixando) nossos países muito mais pobres, mais excludentes, mais desiguais. Incrementaram (e estão incrementando) a discriminação social, racial e sexual, reproduzindo os privilégios das minorias. Exacerbaram (e estão exacerbando) o individualismo e a competição selvagem, quebrando assim os laços de solidariedade coletiva e intensificando um processo antidemocrático de seleção "natural" onde os "melhores"" triunfam e os piores perdem. E, em nossas sociedades dualizadas, os "melhores" acabam sendo sempre as elites que monopolizam o poder político, econômico e cultural, e os "piores", as grandes maiorias submetidas a um aumento brutal das condições de pobreza e a uma violência repressiva que nega não apenas os direitos sociais, mas, principalmente, o mais elementar direito à vida.
A resposta neoliberal é simplista e enganadora: promete mais mercado quando, na realidade, é na própria configuração do mercado que se encontram as raízes da exclusão e da desigualdade. É nesse mercado que a exclusão e a desigualdade se reproduzem e se ampliam. O neoliberalismo nada nos diz acerca de como atuar contra as causas estruturais da pobreza; ao contrário, atua intensificando-as.
O desafio de uma luta efetiva contra as políticas neoliberais é enorme e complexo. A esquerda não deve ser arrastada (ou arrasada) pelo pragmatismo conformista e acomodado segundo o qual o ajuste neoliberal é, hoje, a única opção possível para a crise. Para os que atuamos no campo educacional, a questão é simples e iniludível: logo após o dilúvio neoliberal as nossas escolas serão muito piores do que já são agora. Não se trata apenas de um problema de qualidade pedagógica (embora também o seja), serão piores porque serão mais excludentes.
Os neoliberais estão tendo um grande êxito em impor seus argumentos como verdades que se derivam da natureza dos fatos. Desarticular a aparentemente inquestionável nacionalidade natural do discurso neoliberal Constitui apenas um dos desafios que temos pela frente. No entanto, trata-se de um desafio do qual depende a possibilidade de se construir uma nova hegemonia que dê sustentação material e cultural a uma sociedade plenamente democrática e igualitária.
Pessimismo da inteligência, otimismo da vontade. Nunca a sentença gramsciana teve tanta vigência. Nosso pessimismo da inteligência deve permitir-nos considerar criticamente a magnitude da ofensiva neoliberal contra a educação das maiorias. Nosso otimismo da vontade deve manter-nos ativos na luta contra um sistema de exclusão social que quebra as bases de sustentação democrática do,. direito à educação como pré-requisito básico para a conquista da cidadania, uma cidadania plena que só pode ser concretizada numa sociedade radicalmente igualitária.
(Texto extraído do livro "Escola S.A.", Tomaz Tadeu da Silva e Pablo Gentili - org.)